segunda-feira, 30 de agosto de 2010

terça-feira, 21 de julho de 2009

Gomuck, a nascente do Ganges

Na primeira vez, fui sozinha e fiquei três meses, foi ótimo. Na segunda a viagem foi em grupo. A princípio estranhei, achei que seria complicado muita gente junta na Índia, mas iria de qualquer maneira porque uma das pessoas do grupo era Gloria, a minha mestra. A viagem foi pensada como uma grande peregrinação, com dois pontos principais: a nascente do rio Ganges no norte e o templo de Balaji em Tirupathi, no sul.

Fomos primeiro para o sul, que vale um post a parte. Depois para o norte. Parada estratégica no ashram do Swami Dayananda em Rishikesh e em um micromicrominionibus começamos a subir os Himalayas! O onibus tinha que ser o menor possível por causa do tamanho das estradas. É preciso um veículo pequeno, uma ótima buzina e motorista e fé, muita fé. A pirambeira é tão pirambeira que da janela não dá para ver nem um dedo de terra, só vemos o pneu e o precipício. Em toda curva está escrito "buzine por favor". Para ter uma idéia, um trecho de 300km mais ou menos leva umas 12 horas de viagem.

Depois de um dia inteiro chacoalhando (eu e minhas companheiras de viagem mais chegadas ficavamos lá atrás porque algumas pessoas enjoavam muito e tinham que ir na frente onde o impacto é menor), enfim, chegamos a uma cidadezinha chamada Harsil. O lugar é lindo, ficamos em um acampamento muito confortável, os quartos eram tendas, mas fixas, com banheiros e tal. Tinha macieiras pelos caminhos até o refeitório e uma comida maravilhosa (OK, nessa parte eu sou suspeita porque adoro todas as comidas, até a do ashram que muitos detestam). Chegamos, banho, janta e dia seguinte caminhada!!! Fomos de onibus até Gangotri, a última cidade antes de Gomuck. Uns burricos levaram nossa bagagem (só o necessário para duas noites de muito frio) e nós começamos.

Lá a altitude beira os 4 mil metros. É dar dez passos numa subidinha e parece que foi um tiro de 2km. Um sol de rachar o coco, um friozinho da sombra. Devagar e sempre, fazendo paradinhas estratégicas, uma delas para almoçar um miojo sabor curry - o melhor miojo da minha vida! Durante o caminho fui filmando um pouco e cantando mentalmente para Ganga. Era o que me dava forças para caminhar, refletir, continuar em meu caminho.
Ao cair a tarde começou a ficar bem frio. Perguntávamos para o guia se faltava muito e ele sempre respondia que era duas curvas depois - que nunca chegavam..rsrs
Chegamos já a noitinha, depois de 9 horas eu acho de caminhada. Bhoojbasa era a base, um acampamento com barraquinhas mais modestas, um banheiro que era uma casinha com um buraco no chão e um refeitório que era uma tenda maior. Cheguei com uma enxaqueca horrível e me joguei dentro da barraca, rindo, não acreditava que tinha chegado!!! Logo fomos jantar, vou parar de comentar a comida se não vão achar que eu vou para a Índia só para comer!

Na manhã seguinte seria a caminhada final até a nascente, mais uns 4km para ir e 4km para voltar. O céu era o mais estrelado que eu já vi em toda a minha vida!!! Bhoojbasa é lindo!!!
De manhã, uma bacia pequena de agua morna/fria (a do rio era gelo puro) para higiene básica. Posso dizer que agradeço por quem inventou os lenços umidecidos, rs.
E vamo que vamo. Algumas pessoas passaram mal durante a noite, altitude, esforço e principalmente nervosismo por saber que se tivesse um piripaque ali ia ter que descer no lombo do burro até Gangotri, que também não devia ter muita assistência. No começo foi um pouco tenso, mas todos foram devagar, cada um no seu ritmo. O sol parecia pior, ou o caminho que não tinha quase sombra nenhuma. Mantra para Ganga mais forte do que nunca!
Enfim, chego a nascente! Que força, que som! No buraco mesmo é perigoso ir, muitas pedras rolam, tivemos que ficar um pouco a frente, só admirando o paredão de gelo. A água mais gelada que eu já senti. Só o João Mazza e a Lucia Paiva conseguiram entrar na água, meus heróis!!! Talvez agora com cabelo curtinho eu consiga também...


Voltamos, dormimos mais uma noite em Bhoojbasa e no dia seguinte, caminhada de volta a Gangotri. Algumas pessoas voltaram no burrico. Eu, João e Lucia viemos num pique só para pegar o templo de Ganga aberto. Para descer é outra história...o que levamos 9h na ida fizemos em 4 na volta. Conseguimos pegar o templo aberto, aguenta coração!!! Sensação de missão cumprida. Mas a viagem ainda não acabava ali...

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Bandhara em Rishkesh



Bandhara é uma refeição oferecida para os sadhus que estão pela região. Sadhu é um renunciante, alguém que vive com o mínimo, e depende da caridade alheia para comer. Durante o curso no ashram do Swami Dayanada, ele ofereceu um grande bandhara. Vieram muuuuuitos sadhus, de tudo quanto era jeito. Nem todos os sadhus são swamis (senhor de si), não seguem linhagem alguma de estudo, alguns praticam somente tapas (disciplinas), fazem um voto de manter um fogo sempre aceso por exemplo, ou praticam certos sacrifícios. Nem todo sadhu é swami, mas todo swami é sadhu. Para renunciar, basta jogar seu cordão de brahmane no rio, vestir uma veste laranja rosada e sair por aí errante. A renúncia para se tornar um swami requer um mestre, uma linhagem de ensinamento, um planejamento, um ritual. Logo quando cheguei em Rishkesh, teve um ritual, por volta de seis estudantes renunciaram. É algo emocionante de se presenciar. Os alunos e vários swamis vão ao rio para que os que vão renunciar tomem o último banho como fulano e siclano (depois da renúncia eles ganham outros nomes do Mestre). Depois passam a noite em volta de uma fogueira fazendo rituais. Entre eles tinha uma mulher (o que é bem raro) e estrangeira (mais difícil ainda). Swamiji Dayanada é o máximo!
Bom, voltando ao bandhara. Depois de ver o Swami Dayananda comprimentar um por um e tirar muitas fotos, já quase no final, muitos já estavam indo embora, um velhinho, mas muito velhinho começa a falar comigo, parecia agoniado. Eu não entendia nada do que ele falava então pedi ajuda para uns indianos que estavam ali perto. Alguma coisa já tinha me tocado, desde que vi aquele senhor já tinha ficado estranha. Os indianos "tradutores" me disseram que o velhinho tinha problema no coração e queria saber onde podia pegar um remédio porque estava sentindo dor. E o velhinho ali, falando sem ninguém lhe dar muita atenção, com uma cartela de remédio vazia, gesticulando com dificuldade.
Aaaahh, pra quê!
Só consegui sentar numa escada, onde estava mesmo e desabei o chororô. Não tinha muita explicação racional não. Só chorava e chorava. E os indianos sem entender nada...eles não são muito de demonstrações de emoção assim, públicas. Me diziam que ele ia ficar bem, que há remédio para ele no posto de saúde e tal. E eu chorando, chorando...
Depois ficou tudo bem, o velhinho pegou seu remédio e se acalmou e eu também. rsrs

Despedida, final do curso em Rishkesh


Sala cheia, todos os alunos em pé em fila com seus envelopes de guru dakshina. Swamiji Dayananda sentado, recebia o namaskara de cada um e dava um livrinho com uma fruta de prasada. Eu já com um certo nó na garganta...e de repente começam a cantar o Gurustotram, um dos cânticos mais bonitos na minha opinião e que sempre me emociono até hoje quando canto. Comecei a chorar, primeiro discretamente. Uns alunos indianos se aproximavam perguntando por quê eu estava chorando, diziam "você vai voltar aqui", "ano que vem você está aqui", "não chore", quanto mais falavam, mais eu chorava.
Quando cheguei aos pés do Mestre já era só emoção. Recebi a prasada e sai rapido para fora da sala. Sentei em um banco de frente para o Ganges e desabei. Era um choro de felicidade, de agradecimento, de tristeza, de saudade, de tudo. Eu chorei ali com muita vontade mesmo! rsrs
Passa um tempinho e minha amiga e companheira de quarto no ashram, Carolina, chega também ao banco, com a cara já inchada. As duas ficam sentadas ali, chorando sem parar por algum tempo.
Foi lindo.
Até hoje quando canto Gurustotram me emociono. Na segunda vez em que estive em Rishkesh também me emocionei, ao chegar e ao ir embora principalmente. Aquele lugar significa muito para mim. O que eu aprendi e vivi ali...as aulas, os pujas de manhã cedo e a tarde, os banhos no rio Ganges, as amizades, os sonhos (sonhava quase todos os dias com Swamiji, quando não me respondia durante as aulas, me falava durante a noite)

O velhinho do ônibus para Bangalore

Resolvi sair de Puttaparty poucos dias depois de ter chegado, em mais uma madrugada insone por causa do jet leg. Por volta das 3 da manhã me enfiei em um ônibus catacorno onde ninguém falava inglês. Eu sentei na janela, com meus mochilões no colo (não havia espaço para bagagem, como disse, era um catacorno). 

Nos primeiros dias na Índia, sozinha, ponderando tudo que tinham me falado sobre viajar por aquelas bandas, mal tirava fotografias, sei lá, receio de ser agressivo demais. Enfim, estou eu no ônibus, sentada perto da janela, uma senhora sentou ao meu lado. Eram pessoas bem pobres, a maioria com cestos vazios, provavelmente estavam voltando para seus vilarejos para abastecerem e voltarem para vender em Puttaparty. De repente ouço uma voz cantando uma melodia linda ao som de um chacoalhar de moedas ao fundo. Me viro para ver de onde vinha aquela música, aquela voz tão intensa e vejo um senhor, bem velhinho, cego, sacudindo um pote com umas moedas, pedindo dinheiro. 

Aquela cena toda, miséria pedindo esmola para pobreza, aquele senhor, aquela voz, a madrugada. Veio um choro imediato, como ainda viria muitas vezes pela viagem, ainda contido (mais para o final da viagem, já em Rishkesh, chorei várias vezes feito criança, sem vergonha, sem pudor - para estranhamento geral dos indianos). Ainda tímida tirei a câmera fotográfica da mochila para tentar gravar aquele som. Peguei muito pouco, mas esse momento não sai mais do meu coração. O velhinho cego do ônibus para Bangalore. 

Desabafo

Fui duas vezes à Índia. A primeira em 2005, sozinha, por três meses. A segunda em 2007, com um grupo e principalmente com a minha Mestra, Gloria, peregrinação em um mês de viagem. Importante e fundamental na minha vida, essas viagens até hoje me transformam. 

Tanta coisa que nem sei. Aos poucos vou colocando tudo aqui, vou tentar não escrever esses "testamentos" enormes...rsrs. Por enquanto estou na metade da primeira viagem, isso porque peguei só alguns episódios...(eita!)

Enfim, saudades da mãe Índia, sempre. 

Esse post foi só para desabafar.

domingo, 19 de abril de 2009

Enfim, Varanasi!!!

Acordei no dia seguinte, tomei café da manhã no terraço do hotel e fui andar pelas ruas, tentar achar o hotel em que eu queria ficar, de frente para o Ganges. As ruas lotadas, para variar. Bicicletas, pessoas, motos, vacas, cavalos...tudo. Cheguei ao portão principal para o Ganges, era uma rua bem larga com muito comércio e gente passando. Cheguei as escadarias, virei para a direita e continuei andando. A paisagem era linda e a trilha OM NAMAH SHIVAYA o tempo todo! Muitos indianos se aproximam perguntando se quero andar de barco ( a pergunta mais chata de Varanasi: "boat?", em Mysore era: "flowers?"). Encontrei o tal do hotel, Vishnu guest house, entrei, acertei um quarto e uma hora para me buscarem no outro hotel (não conseguiria chegar lá pelas ruelas e pelo rio teria que vir carregando minhas malas - impossível!). Voltei para o hotel para deixar tudo preparado, eles chegaram na hora certa.

Já instalada em frente ao Ganges, resolvi me aventurar pelas ruelas. É um labirinto, eu tentava ir decorando o caminho, mas volta e meia tinha que perguntar onde era o hotel na volta. Achei uma lan house e finalmente ia me comunicar depois de quase uma semana sem dar notícias. Precisava muito desabafar o que tinha acontecido de Bangalore até Varanasi. Muitas pessoas na Índia me confundiam com indiana, em Varanasi e em Delhi algumas pessoas me perguntaram se eu era de Israel (brasileiro realmente tem cara de qualquer coisa).

Escrevi um email gigantesco com o título de "odisséia"para família e alguns amigos. Meu pai depois contou que leu o email com meus avós e todos choraram. Juro que não fui melodramática, foi perrengue mesmo. Na mesma hora que mandei o email recebi o de uma amiga que estava na Índia e que eu só deveria encontrar com ela em Rishikesh, na parte final da viagem. Ela dizia que tinha resolvido ir para Varanasi e me deu o nome do hotel. Fiquei muito feliz!!! Tudo o que eu queria era abraçar alguém conhecido depois de tanto perrengue! Saí da lan house direto para o tal hotel, era no final do rio. Cheguei lá e ela não estava, deixei um bilhete com o endereço do meu hotel e saí. Peguei um rickshaw (lá o mais comum são os de bicicleta e de cavalo), e de repente cruzo com ela em outro rickshaw gritando "Mariiiina!". Foi incrível, qual seria a chance disso acontecer? Milhares de pessoas na rua, milhares de ruelas e a gente se cruza assim, de repente! Paramos para abraços e conversas. Ela estava com uma amiga argentina. Fomos almoçar. Ela contou que tinha acabado de ler meu email da odisséia, tinha ficado preocupada. Trocamos figurinhas de Índia, como tinha sido para ela e para mim e tal. Combinamos de conhecer alguns lugares juntas.

E assim foi, vimos o amanhecer de barco no rio Ganges, fomos a Sarnath (berço do Budismo) e a Allahabad (encontro sagrado de três rios, era para ser algo mágico, mas para nós foi perrengue total - lá foi meio estranho e levamos horas de onibus lotaaaaaaado na volta.) Fomos ao templo de Hanuman, onde me bateu uma neura da hora, já eram mais de cinco da tarde, eu precisava ir para o hotel porque no rio não tem luz! Cheguei ao portão principal, cheio e iluminado. Mas andei mais 10 metros e era escuridão total e eu sem lanterna!!! Agarrei uma garrafa de agua que havia comprado e fui rezando pelas escadarias (elas também são laterais e não só em direção ao rio). Sinceramente, não sei como consegui enxergar o meu hotel, e ainda dar a volta pelas ruelas porque o portão para o rio estava fechado, mas cheguei sã e salva ao meu quarto!!! Dizem que a noite no rio os leprosos são soltos - mas nem era o meu maior medo. Essa foto dá uma idéia do que eu enxergava na hora...



Minha amiga foi embora dois dias antes de mim de avião para Delhi. Eu fui de trem mesmo para Rishkesh (acho que umas 20 horas de viagem). Nos dois últimos dias aproveitei mais um pouco, visitei mais uns templos, assisti parte de um ritual de morte no rio e bebi um banglassi. Não acho que vale descrever tudo tim tim por tim tim, se não nem eu aguento ler. O episódio do banglassi foi interessante...rsrsrs, foi na véspera de ir embora e no dia seguinte fiquei meio enjoada no trem ( que maravilha!). Comprei numa loja de lassi e levei para o hotel, fiquei com medo de tomar na rua. A percepção do tempo se alterou de maneira absurda. Fiquei parte do tempo no quarto olhando o calangão mutante na parede, escrevendo, arrumando as coisas. Depois desci, fui na lan house, jantei, fiquei um tempo olhando para o rio, para as pessoas. Percebi um certo ar deprê nos gringos ripongas que perambulam por Varanasi. Talvez efeito mesmo de tanto bang, não sei. Já era hora de ir mesmo, de encontro ao meu destino...